Com Direção Musical de Roberto Minczuk e Direção Cênica de Cibele Forjaz, a maior casa de óperas do país recebe, após 23 anos sem ser montada, a obra prima de Carlos Gomes, O Guarani, com libreto baseado no romance de José de Alencar
O mês de maio celebra alguns aniversários marcantes no Theatro Municipal de São Paulo. Após 104 anos de sua estreia no Theatro Municipal de São Paulo e 23 anos após sua última montagem neste teatro, a maior casa de óperas do Brasil recebe a partir do dia 12/5, sexta-feira, às 20h, a montagem da ópera O Guarani, de Carlos Gomes, com concepção geral do líder indígena, ambientalista, filósofo e escritor Ailton Krenak. A direção musical é do maestro Roberto Minczuk, a direção cênica fica a cargo da premiada diretora Cibele Forjaz (Teatro Oficina Uzyna Uzona e Cia. Livre) e a direção de arte do artista Denilson Baniwa e da cenógrafa e figurinista Simone Mina.
O Guarani, ópera em 4 atos de Carlos Gomes, tem seu libreto assinado por Antonio Scalvini e Carlo D’Ormeville e foi inspirado no romance de José de Alencar. Além de sua abertura ser muito conhecida como o tema do programa radiofônico oficial estatal A Voz do Brasil, desde a estreia do programa, em 1935, a obra original carrega em si o romantismo e a busca identitária da obra literária que o inspirou.
Na história, a jovem Cecília de 16 anos, filha de um nobre português, se apaixona por Peri, um jovem indígena de 18 anos. O amor os une e a união desafia questões culturais. Também estão presentes no enredo a história da disputa entre os povos das tribos Aimoré e Guarani e o interesse econômico da Espanha na colônia portuguesa – esse, na figura de Gonzales, aventureiro que se interessa por Cecília. Mas, também e sobretudo, pelo domínio das terras dos indígenas.
A ópera estreou em 1870 no Teatro Scala de Milão e montá-la em 2023 requer atualizações. Com este intuito, como explica a diretora geral do Theatro Municipal de São Paulo, Andrea Caruso Saturnino, “assumimos o desafio de reunir um coletivo multicultural, incluindo pessoas com experiência fora do ambiente da ópera, que se prontificaram a mobilizar imagens, sons e textos no propósito de revelar outras possibilidades do libreto inspirado em José de Alencar”. Assim, somamos os saberes da casa, com a Orquestra Sinfônica Municipal e o Coro Lírico, sob a direção musical do maestro Roberto Minczuk, à concepção geral de Ailton Krenak e a participação de uma Orquestra e Coro Guarani, além de artistas indígenas, como o artista, curador, designer e ilustrador Denilson Baniwa, responsável pela cenografia e co-direção de arte. A direção cênica fica a cargo de Cibele Forjaz e soma-se ao trabalho de dramaturgista de Ligiana Costa, ao de direção de arte e cenografia de Simone Mina e ao de assistência musical de Lívio Tragtenberg.
Entre os intérpretes de Peri, destacam-se o brasileiro Atalla Ayan e o chileno Enrique Bravo nos diferentes elencos das récitas e, como Gonzales, se alternam os barítonos brasileiros Rodrigo Esteves e David Marcondes. Ceci, que já foi interpretada por grandes divas, entre elas a grande Bidú Sayão em 1936, terá como intérpretes a soprano bielorrusa Nadine Koutcher e a gaúcha Debora Faustino.
Para o maestro Roberto Minczuk, o Guarani é uma obra que tem um brilho único, tanto para as vozes protagonistas de Cecília e Peri, quanto para todos os demais personagens da ópera. “Traz partes virtuosísticas, empolgantes e sublimes para o Coro e também para a Orquestra. É uma ópera de um poder único e de uma vivacidade, que promete impressionar o público que a assiste”.
Presente em cena, ainda, e de acordo com a polifonia da pessoa humana, em diversos povos indígenas, o ator David Vera Popygua Ju que interpreta Peri-Eté, um Guarani “verdadeiro” que se relaciona com os cantores líricos. Em cena também, a atriz, artista, ativista e poeta Zahy Tentehar Guajajara, do povo Tentehar-Guajajara, nascida na Aldeia Colônia, Reserva Indígena Cana Brava no Maranhão. “São Paulo é uma terra guarani e, para a maior parte das pessoas, eles são invisíveis. Mas, na ópera, seu canto estará presente”, diz Cibele Forjaz, a diretora cênica convidada. Uma orquestra indígena, com instrumentos de sua cultura, seu coro e sua dança também estará presente em momentos específicos da récita.
As obras de Denilson Baniwa interagem com a arquitetura do Theatro e compõem o conceito no qual se desenrola a ação. Na terra explorada, mundo-mercadoria e mundo-natureza se contrapõem visualmente, relacionando ouro e corpo, sangue e petróleo, e evidenciando uma exploração agressiva, irreversível e que segue em curso até os dias atuais. “É uma obra de mais de cem anos e é a primeira vez que tem pessoas indígenas a reelaborando e pensando a partir de uma perspectiva atual. Enquanto o Ailton Krenak elabora o discurso e a função da ópera para a cultura e sociedade brasileira, estou feliz de estar junto, elaborando a imagem. Significa pensar a ópera e o livro como parte da formação da imagem que as pessoas têm da população indígena”, ressalta Baniwa.
Na montagem de O Guarani de 2023, as questões de identidade presentes no original se rearticulam sem deixar de fazer reverência à importância histórica da obra de Carlos Gomes e a de José de Alencar. “Estamos fazendo uma montagem de O Guarani preservando Carlos Gomes e atendendo também ao apelo de Mário de Andrade a que salvemos Peri!, revelando possibilidades do libreto à luz de outras leituras da antropologia e das artes onde os indígenas despontam nesse século 21, com disposição a tomar a palavra, sem licença ou sem temor da crase (!) – que como já foi dito, não foi feita para humilhar a ninguém “, explica Ailton Krenak.
“A encenação está longe de ser romântica, mas respeita e incorpora a força simbólica e icônica dessa primeira grande ópera brasileira”, pontua Cibele Forjaz. “É uma releitura viva, para o momento presente, consciente de que estamos num país multiétnico, plurilinguístico, com culturas diversas que têm o direito de permanecerem diversas e de serem assim reconhecidas e valoradas”, completa.
Ailton Krenak é ativista do movimento socioambiental e de defesa dos direitos indígenas, organizou a Aliança dos Povos da Floresta, que reúne comunidades ribeirinhas e indígenas na Amazônia. Escreveu vários livros, entre eles: “Ideias para adiar o fim do mundo”, “O amanhã não está à venda”, “Lugares de origem” e “A vida não é útil”, obras que compartilha reflexões e opiniões acumuladas em suas viagens pelo Brasil e pelo e pelo mundo acerca dos principais problemas socioambientais da contemporaneidade. O nome Krenak significa, em sua etimologia, cabeça (kre) da terra (nak). Os Krenak ou Borun são os últimos “Botocudos do Leste”.
Serviço
Ópera IL Guarany — O Guarani, de Carlos Gomes
Libreto de Antonio Scalvini e Carlo D’Ormeville
Theatro Municipal — Sala de Espetáculos
12/05/2023 • 20h
13/05/2023 • 17h
14/05/2023 • 17h
16/05/2023 • 20h
17/05/2023 • 20h
19/05/2023 • 20h
20/05/2023 • 17h
ORQUESTRA SINFÔNICA MUNICIPAL
CORO LÍRICO MUNICIPAL
ORQUESTRA E CORO GUARANI